Os fãs de rock nunca entenderam: por que Elvis Presley, podendo escolher garotas em todo o mundo, inclusive modelos e atrizes de cinema, optou por se casar com Priscilla Ann Beaulieu, uma jovem tímida e recatada que conheceu quando ela tinha apenas catorze anos? O longa Priscilla, de Sophia Coppola, que estreia nos cinemas, dá pistas sobre esse fato.
Apesar de já ser famoso e bem-sucedido, Elvis fora convocado e teve de prestar serviço militar em uma base norte-americana na Alemanha. Lá, carente de amigos e, principalmente, de amigas, conheceu Priscilla, filha de um oficial da Força Aérea americana. Longe de casa e sem o glamour a que estava acostumado, encontrou na jovem uma amiga que ouvia seus problemas e o acompanhava sem questionar seus hábitos.
Embora ela tenha se mudado para Graceland, em Memphis, aos 17 anos, a relação platônica só foi se concretizar de forma plena após ela se tornar maior de idade. Pelo menos é isso que diz o roteiro, cuja polêmica sobre a questão da idade invadiu as redes sociais. Quem garante a veracidade é a própria Priscilla: o filme é baseado em sua autobiografia Elvis e Eu.
O rei do rock a oficializou como rainha em maio de 1967, quando ela já tinha 21 anos e era uma das mulheres mais famosas do mundo. Por muito tempo, porém, sua história foi eclipsada pelo brilho do marido.
O que a produção busca revelar agora é que, por trás da garota que cresceu dentro de um conto de fadas, existia uma mulher de personalidade que só se viu à vontade quando escapou da desilusão — e quando o decadente castelo de cartas começou a ruir.
Sophia Coppola captura os dez anos do relacionamento do casal com riqueza de detalhes em relação à moda e ao estilo da época.
Sobre o relacionamento, em si, prefere ser distante e, às vezes, um pouco fria. Quer mostrar, talvez, que aquele era um mundo tão à parte, que somente os dois envolvidos compreendiam realmente o sentimento que os unia.
A trama se desenrola a partir de memórias íntimas e de um ponto de vista infantil que se expande à medida que Priscilla cresce. É uma transição delicada, mas que transforma a narrativa.
Nada de shows
O filme é um retrato imersivo em uma existência glamourosa, mas também uma visão delicada e cheia de detalhes sobre uma jovem que realiza o sonho — e percebe que ele está longe de ser perfeito.
Desde o primeiro momento, a diretora deixa claro que trata-se de uma cinebiografia sobre Priscilla, não sobre Elvis. Não há uma única cena de show nem dos filmes do cantor.
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Há apenas citações indiretas sobre seu sucesso, por meio de revistas de celebridades que sua mulher se vê obrigada, pela curiosidade, a folhear. Na mansão de Graceland, sempre acompanhado por uma entourage que lembra a dos jogadores de futebol dos dias de hoje, Elvis é retratado como um garoto mimado, um apaixonado por armas que se rende, pouco a pouco, ao vício em remédios para dormir.
São evidências dos excessos que o levaram à morte em 1977, cinco anos depois da separação da mulher. Em 1972, Priscilla abandonava Graceland, levando consigo somente o carro conversível, uma mala de roupas e a única filha do casal, Lisa Marie.
“Ao ler a história pela primeira vez, me chamou a atenção como foi fácil se identificar com o que ela viveu”, afirma Sophia. “Ela sempre foi vista como a namorada de Elvis, mas senti que havia uma história mais interessante para contar: um desejo infantil que se tornou realidade, mas não da forma como ela imaginava.”
Se a carreira de Elvis foi essencial para compreendermos sua época, vemos que a vida de Priscilla também foi importante para lembrarmos como o papel da mulher se transformou desde então.
Sophia Coppola e a força de suas protagonistas
Sophia Coppola não tem problemas em admitir que seus filmes têm foco voltado para as mulheres. Claro que eles também apresentam personagens masculinos — sua parceria com Bill Murray em Encontros e Desencontros e On the Rocks é admirável —, mas sua câmera olha de maneira diferente para elas.
A diretora transformou um desastre em uma carreira de sucesso: filha de Francis Ford Coppola, foi duramente criticada por sua atuação em O Poderoso Chefão III.
Em vez de desistir, foi para os bastidores e estreou como diretora nove anos depois, em 1999. As Virgens Suicidas fez sucesso no Festival de Cannes e lhe rendeu o prêmio de melhor filme do ano pela MTV.
Sua voz original definitiva porém, só veio em Maria Antonieta, onde ela observou a indulgência que existia em Versailles por meio dos olhos de uma garota ingênua jogada ao centro do poder.