Edna Sampaio (PT) foi eleita vereadora em Cuiabá com 2.902 votos e é a única mulher negra na Câmara de Vereadores. Natural de Cuiabá, a professora da Universidade do Estado de Mato Grosso (Unemat), líder sindical e militante do movimento feminista e negro em entrevista ao Jornal Centro-Oeste Popular, fala sobre os desafios para 2022, das metas na sua gestão, prioridades entre outros assuntos. Confira.
Centro Oeste Popular – Como a senhora se sente assumindo em janeiro a cadeira na Câmara de Cuiabá?
Edna Sampaio – Me sinto privilegiada. Sou uma mulher negra, que vem de uma família muito pobre, consegui estudar com muito esforço, já tinha chegado em um lugar que não imaginava pela minha origem social, pela minha condição étnico racial, e me sinto privilegiada por ser uma mulher preta, com toda minha história como tantas outras mulheres desse país, dessa cidade, ser uma voz que representa o povo que é maioria e que não tem representatividade na política. É um grande privilégio e também uma grande responsabilidade, e é assim que me sinto.
CO Popular – Quais serão os maiores desafios que espera encontrar no Legislativo municipal?
Edna Sampaio – Acho que teremos um ano muito difícil, um ano em que vamos estar sofrendo ainda de forma mais acentuada os efeitos da pandemia, a desaceleração econômica. Há uma meia dúzia de gente que ganhou muito dinheiro no Estado, que são os bilionários do agronegócio, que além das isenções fiscais, ainda tiveram uma taxa de lucratividade alta por conta da alta do dólar, por exemplo, mas a maioria do povo sofre com as consequências do desemprego, do desamparo, e o poder público, o Estado, tem sido destruído e atacado durante todo o Governo Bolsonaro. Então a população mais vulnerável, a mais pobre, que é a maioria do nosso povo, precisa muito de apoio de quem possa enfrentar essa lógica da destruição do Estado e do lucro desmedido que
destrói vidas, não apenas vidas humanas, mas também a vida do planeta. Vai se com certeza um ano muito difícil, que vai exigir de nós muita capacidade, sensibilidade, capacidade de diálogo, capacidade de reconstrução e de apoio àquelas pessoas mais vulnerabilizadas.
CO Popular – Como será a sua relação com a vereadora Michelly Alencar?
Edna Sampaio – Acho que vai ser muito boa. Somos de partido diferente, temos visões diferentes, mas uma coisa temos em comum: somos duas mulheres que sabem muito bem o peso da estrutura machista, uma sociedade muito restritiva para mulheres e estamos preocupadas com a mesma questão, e vamos dirigir o nosso olhar para o mesmo lugar, que é a proteção da vida das mulheres, que é oferecer oportunidade para as mulheres. Em muitos aspectos seremos aliadas, é a minha expectativa. Somos duas mulheres muito diferentes, mas somos mulheres e isso nos torna aliadas na nossa posição política.
CO Popular – A senhor pretende ter uma postura independente ou pode ser da base aliada do prefeito Emanuel Pinheiro?
Edna Sampaio – Do ponto de vista ideológico, político e partidário, eu sou oposição ao prefeito, o MDB é base do Governo Bolsonaro, agora recentemente o filho do prefeito votou com o PT a favor do Fundeb, achei positivo isso, mas o MDB não apenas sustentou o golpe à nossa presidenta Dilma Rousseff que foi tirada da presidência sem ter cometido crime algum, como também tem sustentado políticas neo liberais do ministro Paulo Guedes e do presidente Bolsonaro.Pela retrospectiva em relação ao MDB, sou uma petista que me alinho a definição ideológica do meu partido. Estamos em polos diferentes, estamos defendendo projetos para a sociedade diferentes. Agora, como vereadora na relação com o prefeito reeleito Emanuel Pinheiro, a minha posição
vai ser a posição que sempre tive, ou seja, de defesa dos direitos dos trabalhadores, em especial dos servidores públicos e dos serviços públicos, e vou adotar uma posição de uma oposição, que seja não seja uma oposição que visa se projetar pelo simples fato de ser oposição. Pretendo fazer uma oposição qualificada, discutindo o que é bom para a população e aquilo que for bom para a população e estiver dentro daquilo que acreditamos, vamos obviamente votar favoravelmente. E aquilo que for prejuízo para a população vamos atuar de forma bastante tenaz como tem sido todos os mandatos do PT, na defesa da classe trabalhadora de Cuiabá.
CO Popular – A eleição da senhora, significa que o PT ainda está vivo em Cuiabá?
Edna Sampaio – Eu acho que o PT está vivo em todos os lugares. O PT é um partido grande, com grande capilaridade, talvez o partido com maior capilaridade no Brasil, tendo sofrido ataques nunca antes visto no Brasil contra uma organização partidária. O PT foi criminalizado e mesmo assim temos a segunda maior bancada no Congresso Nacional e é o maior partido da oposição desse país, e tem contribuído muito para defender os interesses da classe trabalhadora no Congresso Nacional. Então o PT nunca morreu, não vai morrer, enquanto existir gente como eu e milhares de pessoas independentes de ter ou não mandato, mas que acreditam na sociedade mais justa, de um partido que defenda o trabalhador, o PT estará vivo, e fico muito feliz de fazer parte
desse partido que nunca decepcionou a classe trabalhadora na defesa intransigente dos direitos. O PT completa 40 anos com toda energia de um partido que faz parte importante no jogo político nacional. Não se pode falar hoje da política brasileira sem falar do papel que o Partido dos Trabalhadores exerce.
CO Popular – A eleição da senhora dá força para o PT disputar a eleição de 2022?
Edna Sampaio – Com certeza. Eu vejo o protagonismo do PT na política de Mato Grosso e de Cuiabá. E o protagonismo com uma candidatura que vamos poder apresentar nosso projeto e espero que em 2022 e 2024, quando acontece nova eleição para prefeito, tenhamos candidatos que possam fazer a defesa de nosso projeto. Acredito que isso é o nosso caminho.
CO Popular – Como a senhora analisa a disputa pela presidência da Câmara? Concorda com a formação de uma chapa de “novatos”?
Edna Sampaio – Acho importante. Apoio a iniciativa, acho que a Câmara precisa ser renovada, precisa de pessoas que cheguem com gás novo, que possam oferecer credibilidade e novas perspectivas para a Casa e penso que é por isso que a população elegeu a maioria dos vereadores para um primeiro mandato. Então é natural que tendo os novos vereadores a maioria, que se articulem para assumir a direção da Casa. Acho salutar esse revezamento na direção da Casa, especialmente a partir da postura de independência da Mesa Diretora que é um instrumento institucional para poder fazer o papel do Poder Legislativo. Na legislatura passada, o que aconteceu? Você tinha a organização de dois grupos em posições extremadas, dois grupos que impediram que a Casa pudesse ter fundamento mais fiel ao seu papel de legislar, de fiscalizar, e penso que precisamos na política amenizar as paixões e trabalhar com razoabilidade, no papel
institucional de cada um. O prefeito foi eleito para ser o chefe do Poder Executivo e os vereadores foram eleitos para legislar, fiscalizar e cumprir o seu papel. Quando o Poder Executivo interfere e captura o Legislativo para baixo dele, não é bom pra ninguém, nem para quem está na chefia do Poder Executivo, não é bom para o Poder Legislativo, que deveria ser um poder independente, acaba não sendo, portanto não cumpre seu papel, e é pior ainda para a população, que vê indistinto dois poderes que foram eleitos para funções diferentes e acabam um suprimindo o outro. Então vejo com muito bons olhos a proposta de uma Mesa de novatos, na expectativa de que o compromisso em torno da independência da Mesa, da autonomia, do respeito e da transparência possa se manifestar de forma bastante importante nessa nova legislatura.